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O rastreio da salmonelose de produtos avícolas no Laboratório Regional de Veterinária e Segurança Alimentar

Quanto mais não seja por amplas notícias de intoxicações alimentares, todos já ouvimos falar da salmonelose, nada mais que uma infeção causada por uma bactéria do género Salmonella spp. Esta zoonose assume-se como um sério problema não só económico, mas também epidemiológico, na medida em que compromete a saúde pública global. Normalmente caracteriza-se por uma elevada taxa de morbilidade e até mortalidade, sobretudo em pessoas mais vulneráveis, como doentes, crianças, idosos e gestantes.

A estirpe bacteriana mais comum e responsável por surtos relacionados com a ingestão de ovos crus ou semicrus denomina-se Salmonella enteritidis e é responsável por quadros de gastroenterite que, porém, raramente carecem de hospitalização. Não ocorrendo internamento, não há isolamento laboratorial do agente do alimento contaminado nem qualquer notificação, o que explica que não se saiba ao certo qual é a ocorrência de salmoneloses na população humana na Região.

Já a febre tifóide causada pela Salmonella typhi, que só acomete os seres humanos, tem uma sintomatologia mais severa, que inclui, para além de vómitos e diarreia, febre alta e até septicémia.

De igual forma, embora de manifestação clínica mais branda, a Salmonella paratyphi também pode evoluir para um quadro septicémico.

figura1.1 alimentos avicolas associados a infecao alimentar por Salmonela spp figura1.2 alimentos avicolas associados a infecao alimentar por Salmonela spp
Figura 1 - Alimentos avícolas associados à infecção alimentar por Salmonella spp  

Há ainda outras salmonelas que também desenvolvem quadros de patologia gastrointestinal com dores abdominais, vómitos e febres baixas, mas que raramente têm desfecho fatal. Na origem destas intoxicações estão produtos alimentares, sobretudo avícolas como carne e ovos (figura 1), mas também leite, mariscos, carne bovina e suína, etc., e são estes produtos de origem animal (entre outros) que são analisados no Laboratório Regional de Veterinária e Segurança Alimentar (LRVSA) para deteção e rastreio de salmonelose.

figura2.1 material rececionado no LRVSA para pesquisa de Salmonela spp figura2.2 material rececionado no LRVSA para pesquisa de Salmonela spp
Figura 2 – Material rececionado no LRVSA para pesquisa de Salmonella spp
(ovos e pintos do dia) 

Não obstante uma grande parte das infeções serem através da ingestão alimentar de origem avícola, há que relembrar que este agente microbiano, na verdade, está presente nas fezes e noutros elementos orgânicos (como o leite) da maioria dos animais, como o gado bovino, caprino, porcino, entre outros).

figura3.1 material rececionado no LRVSA para pesquisa de Salmonela spp
figura3.2 material rececionado no LRVSA para pesquisa de Salmonela spp
Figura 3 – Material recepcionado no LRVSA (NPV)
para pesquisa de Salmonella spp (fezes do chão
e esfregaço de aviário com botas estéreis
de material absorvente) 

E é neste ponto que o médico veterinário assume importância, não só no controlo da doença nos animais, mas sobretudo na prevenção da mesma, mediante a implementação de medidas profiláticas como a vacinação e ações de natureza higiosanitária. Mas incumbe também a este e outros profissionais rastrear a doença nos bandos e rebanhos solicitando aos produtores ou procedendo ao envio de amostras dos aviários e explorações para análise laboratorial – no caso da Região Autónoma da Madeira (RAM), estas efetuam-se no Laboratório Regional de Veterinária e Segurança Alimentar (LRVSA).

No Núcleo de Patologia Veterinária (NPV) do LRVSA, mais concretamente, analisam-se amostras de natureza fecal, poeira colhida na exploração, mecónio ou cadáveres de pintos (figuras 2 e 3) provenientes de aviários de reprodução ou de produção de frangos ou de ovos, ao abrigo das exigências de Planos Nacionais de Controlo de Salmonella spp. Estes planos são estipulados por regulamentação europeia e têm como objetivo a redução da prevalência e do risco que estes microrganismos constituem para a saúde pública, o que só é possível mediante o rastreio dos mesmos em aviários que, ao positivarem, serão de imediato alvo de sequestro/isolamento e tratamento (ou mesmo abate) do bando antes que os seus produtos entrem no circuito de consumo alimentar humano ou animal.

 
figura4.1 meios de enriquecimento e detecao usados na analise de rastreio de Salmonela spp figura4.2 meios de enriquecimento e detecao usados na analise de rastreio de Salmonela spp
Figura 4 – Meios de enriquecimento e detecção usados na análise de rastreio de
Salmonella spp  

É de ressalvar ainda neste artigo que a metodologia laboratorial (fig. 4) que permite o rápido diagnóstico de salmonelose usada no LRVSA é concordante com o procedimento normativo da ISO 6579-1:2017, estando acreditada, tal como os respectivos técnicos executantes, pelo IPAC (Instituto Português de Acreditação).

Até aqui, tem-se destacado a importância da ação oficial médico-veterinária e do LRVSA, mas há que mencionar que, a par destes, os produtores dos aviários também assumem um papel fundamental no despiste e controlo desta zoonose na Região.

figura5.1 bando de frangos em pavilhão e bando de galinhas poedeiras em baterias figura5.2 bando de frangos em pavilhão e bando de galinhas poedeiras em baterias
Figura 5 – Bando de frangos (em pavilhão) e bando de galinhas poedeiras (em baterias)

Ao abrigo do mesmo PNCS, estes podem (e devem) mesmo efetuar a amostragem dos seus próprios bandos (autocontrolo) três semanas antes do abate dos frangos ou durante a fase de cria/recria ou no período de postura de ovos para incubação ou para consumo ou ainda dos pintos do dia antes do início da sua descarga, conforme a natureza da exploração em causa (bandos de frangos, de reprodução ou de galinhas poedeiras) (figura 5), com envio sequente para o laboratório.

Cabe também ao produtor, em articulação com as autoridades higiossanitárias, o reforço da vigilância sanitária e das medidas de biossegurança na sua exploração, não só enquanto aguarda o resultado laboratorial definitivo, mas sobretudo se esse resultado for positivo. Em simultâneo, e mediante o necessário sequestro sanitário do bando antes do eventual abate, devem ser assegurados aos animais todos os requisitos de bem-estar animal. Já os ovos dos bandos de reprodução ou dos bandos de aves poedeiras que forem positivos não serão colocados no mercado.

Além das responsabilidades de natureza técnica, clínica e laboratorial, e da própria produção, há ainda responsabilidades passíveis de se atribuir a outros, como fornecedores de serviços (caso particular da restauração) e aos próprios consumidores no que respeita ao cumprimento higiossanitário para prevenção desta zoonose, até porque a grande maioria das infeções alimentares são de origem doméstica. E, pelo facto, não é excessivo relembrar neste artigo que a temperatura de armazenamento e acondicionamento dos alimentos deve ser respeitada para evitar qualquer multiplicação de bactérias.

De igual forma, há que atentar à correcta cozedura dos alimentos (a altas temperaturas), de modo que a eventual flora microbiana que neles exista possa ser destruída, evitando o consumo de alimentos crus ou mal cozinhados, sobretudo ovos e produtos avícolas, mas também leite e carnes de outros animais.

O melhor combate a zoonoses, como a salmonelose, e a defesa da Saúde Pública passam assim por uma ação conjunta e articulada entre as autoridades e entidades de saúde e de veterinária, os produtores de animais, os prestadores de serviços que envolvam comercialização de alimentos e os próprios consumidores, pois em causa está não só o cumprimento do que está preconizado na lei mas também a garantia da Segurança Alimentar de toda a comunidade regional.

 

Sílvia Vasconcelos
Direção Regional de Agricultura e Desenvolvimento Rural

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