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2.ª Mostra do Cuscuz - um sonho que se concretiza

mostra do cuscuzCARTAZ O cuscuz é um alimento árabe com proveta e veneranda idade, que aquele povo na sua aventura conquistadora de há doze séculos disseminou pela Europa, a partir da Península Ibérica, e pelas regiões central e atlântica de África.

Hoje, em Marrocos, granjeia o estatuto de prato nacional, sendo feito à base de sêmola de cereais, principalmente do trigo duro, e acompanhado com carnes, legumes e frutas secas, num conjunto bastante temperado e aromático, mais podendo ser adoçado com açúcar e canela, e servido com leite ou iogurte.

Rebobinando o filme da história, em Portugal o cuscuz passou a ser conhecido desde o reinado de D. Manuel I (1495-1521), para cuja confeção se utilizava a farinha de milho ou de mandioca. E foram os colonos lusos que o levaram para o Brasil, preparado este que, mais tarde, impulsionado e apurado pela vaga africana, feito com base em farinha ou polvilho de milho, arroz ou mandioca, obteve uma generalizada dispersão de norte a sul, constituindo alimento ainda hoje muito enraizado na gastronomia tradicional brasileira.

Na Madeira, o cuscuz é referenciado por vários notáveis historiadores insulares como um legado cultural da presença de árabes na ilha por entre os séculos XV e XVI. Desde essa época coeva por cá ficou, sobretudo pelas mesas do meio rural, acrescentando-lhe o engenho dos madeirenses, ao longo dos tempos, características muito próprias, quer quanto à utilização de certos ingredientes à massa (a segurelha), como principalmente quanto ao modo de fazer.

 

Se Teófilo Braga (1843-1924), na obra «Povo Português nos seus Costumes e Tradições», de 1885, constava-o especialidade apenas viva na Madeira, referindo que aqui fazia-se «cuscuz, e leva-se de presente a papada aos fidalgos», passados todos estes anos, a tradição da sua feitura não deixou de, paulatinamente, ter vindo a perder a importância que então chegou a deter.

Contudo, e sem a mínima desconsideração por outros locais da Região onde seja ainda mantida a sua produção, a paróquia dos Lameiros, de São Vicente, liderada pelo jovem e empreendedor pároco Hugo Gomes, vem porfiando denodadamente para que o cuscuz volte a merecer uma página de destaque no que se poderá chamar “pantagruel” madeirense: não só recuperando a tradição do bem-fazer cuscuz das gentes do sítio dos Lameiros e de outras zonas do concelho de São Vicente, mas visando mais longe, e prosseguindo trabalho para a criação de condições que permitam aumentar o fabrico deste singular pitéu, para o fazer chegar, em qualidade e quantidade, aos grandes núcleos de consumo citadino, proporcionando fonte de rendimento à comunidade envolvida. Para tal, o projeto previsto vai desenvolver-se em duas linhas paralelas e concordantes. Por um lado, recorrendo aos apoios financeiros para o desenvolvimento do mundo rural, incluídos no PRODERAM 2020, é objetivo instalar uma Oficina Artesanal de Cuscuz que, tirando partido de espaço existente na Igreja da Nossa Senhora da Saúde dos Lameiros, congregue as devidas condições operacionais e de garantia de segurança alimentar a uma produção regular e controlada desta nobre iguaria. Entretanto, o estudo preparatório quanto à organização espacial e localização dos aparatos de cozinha desta Oficina, já foi desenvolvido pelos serviços da Secretaria Regional de Agricultura e Pescas (o qual será apresentado no âmbito precisamente da 2.ª Mostra do Cuscuz, a realizar este domingo 18 de outubro).

Por outro lado, no sentido de valorizar ainda mais o cuscuz de São Vicente, paralelamente, a paróquia dos Lameiros está a planear a constituição de um agrupamento de produtores que possa dar início ao processo de obtenção para o produto, do estatuto de proteção e certificação da União Europeia referente a uma Indicação Geográfica Protegida. Embora galardão de alcance complexo, muitos passos com este objetivo têm sido dados, designadamente ao nível documental, marcando também presença nesta 2.ª Mostra do Cuscuz, a Eng.ª Ana Soeiro da Qualifica - Associação Nacional de Municípios e de Produtores para a Valorização e Qualificação dos Produtos Tradicionais Portugueses, com vasta experiência em candidaturas desta natureza.

À equipa liderada pelo padre Hugo Gomes poderá aplicar-se, com toda a justiça, o que escreveu um dia Robert Shinyashiki, médico-psiquiatra e escritor brasileiro nascido em 1952: «Tudo o que um sonho precisa para ser realizado é alguém que acredite que ele possa ser realizado».

Este domingo coloque na sua agenda uma deslocação aos Lameiros para, entre outras interessantes atividades, assistir ao laborioso processo de preparação da iguaria para a qual, como bem escreveu o Visconde do Porto da Cruz (1890-1962), é «necessário trabalho e habilidade», assim como, naturalmente, degustá-la e, se o pretender, adquiri-la.


Paulo Santos
Diretor Regional de Agricultura

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