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Projeto SWOP – um regresso ao mais verdadeiro

swop1Embora leigo nas matérias que ao vinho toca, aceitei a proposta de amiga para assistir a uma tertúlia sobre a bebida a ser dirigida pelo Professor Doutor Virgílio Loureiro, ação inserida no âmbito da recente inauguração da "Vinhos & Segredos" no Funchal, um projecto das famílias Barros e Garcia de Castro, a primeira de empresários madeirenses, e a segunda de produtores de vinho no Douro.

Pelo início, motivou-me mais o palestrante, pelos seus dons de oratória e profundos conhecimentos do agroalimentar, do que propriamente o tema a focar.

Do Professor, agora aposentado, já tinha consistentes referências, quando frequentei o Instituto Superior de Agronomia, onde lecionou Microbiologia Industrial, Microbiologia Alimentar e Microbiologia Enológica.

Quanto ao seu percurso como enólogo, não o conhecia tão bem. Fiquei mais esclarecido ao ler o impressionante currículo do batizado "Pai do Dão Moderno", de que apenas referencio o que julgo elucidativo: notabilizou, entre muitas outras, marcas como a Quinta do Cabriz, Cruz Miranda, Dona Berta e Quinta dos Termos; indigitado Enólogo do Ano em 1995 pelo Roteiro de Vinhos Portugueses; responsável pelo Guia Repsol "Os Melhores Vinhos de Portugal" de 2002; consultor da SONAE, na seleção de vinhos e conceção de feiras, e auditor da APCER- Associação Portuguesa de Certificação, no domínio da enologia. Paralelamente, tendo aprofundado as muitas questões que envolvem o vinho, da História à Geografia, do solo ao clima, da paisagem ao terroir, da videira ao vinho, do vinho à garrafa, da bebida à comida, da prova ao prazer, organizou e lecionou, seja em Portugal como no estrangeiro, cursos de iniciação e avançados de Prova de Vinhos e de harmonia de vinhos com a comida.

No passado dia 22 de fevereiro, ao fim da tarde, num hotel da zona do Lido, realizou-se então aquela tertúlia, sob o título «Uma bebida mágica, divina e irresistível», na qual o Professor Virgílio Loureiro, durante quase duas horas, discorreu sobre a forma como o vinho seduziu os nossos antepassados ao longo dos tempos e se converteu num símbolo da civilização ocidental.

Numa exposição muito bem acompanhada com imagens ilustrativas, cruzou os oito milénios da História desta bebida, na sua viagem desde o Cáucaso (6.000 anos a.C.) até à Peninsula Ibérica e, nesta, até ao Alentejo (500 anos a.C.).

Para uma plateia atenta, o distinto enólogo narrou (com o entusiasmo de quem conta uma aventura empolgante), os principais aspetos do vinho em várias civilizações (egípcia, grega e romana) e religiões, onde a bebida sempre mereceu notória importância e dispôs de um estatuto mais ou menos associado ao transcendente ou ao divino. Como referiu Virgílio Loureiro, a origem desta inestimável herança mediterrânica só foi possível pela combinação de 3 "elementos": as uvas, um recipiente (os primeiros de barro) e a inteligência humana. 

Pautando a sua preleção, com doses q.b. de humor, o Professor não deixou de salientar que o vinho, além da bebida sempre presente no quotidiano dos homens, deteve também, por si ou misturado com outros produtos, principalmente de plantas, a qualidade de remédio e panaceia para muitos males, tanto mais que só se passou a beber água, tal como a conhecemos salubre, a partir do século XIX.

 

swop2Para demonstrar este papel na saúde, o palestrante foi buscar exemplos mais contemporâneos como os dos vinhos do Porto "quinados" (mostrou, com surpresa para a maioria do auditório, um slide de um Vinho da Madeira também com esta especialidade), isto é, com quinino, substância com reconhecidas propriedades antimaláricas e que obteve muito sucesso junto das comunidades portuguesas nas ex-colónias ultramarinas.

Neste contexto, mais deu nota de um célebre "vinho nutritivo de carne", sim "carne", ou seja, com proteína animal, tomado então como fortificante.

No avanço da preleção, Virgílio Loureiro foi polémico, afirmando serem os vinhos atuais, ou a sua maioria, uma «confeição» dado que, como na arte da confeitaria, são mais que o resultado da fermentação alcoólica das uvas e sim o da mistura de tantos e diversos ingredientes, utilizados para conferirem uma certa cor, e determinados sabores e aromas.

Para confirmar poderem os sentidos ser mais ou menos facilmente iludidos, foram feitas algumas provas "cegas" de vinhos durante a comunicação, um dos quais a maioria dos presentes identificou, principalmente pelo odor, como sendo provavelmente um vinho generoso do Porto ou da Madeira, e que não era mais do que um vinho feito segundo uma receita milenar dos romanos, que contém "feno-grego".

Depois de saber que foi um médico português de nome Fernando ou Moisés Mendes, que no século XVII criou a "Água de Inglaterra", que levava quinino, percursora da água tónica, seguiu-se um memorável jantar vínico, onde os comensais foram confrontados com uma perfeita harmonização entre pratos de excelente confecção e um não menos irrepreensível catálogo de vinhos.

E perguntará o leitor, e com toda a razão, o que é tudo isto tem a ver com o projecto SWOP, e o que é, afinal, este?

Ora, os vinhos apresentados à degustação no jantar realizado após a tertúlia do Professor Virgílio Loureiro, são do cardápio SWOP, bebidas estas que se encontram à venda na néscia loja "Vinhos & Segredos", à Rua das Maravilhas, e o reputado enólogo, desde a primeira hora, apadrinhou o projeto.

SWOP é o acrónimo de Secret Wines Of Portugal, o qual tem por principal objetivo desvendar e comercializar os segredos mais bem guardados do vinho português. Vinhos concebidos por pequenos produtores portugueses, incluindo madeirenses, exclusivamente de casta nacional, e oriundos de algumas das mais carismáticas regiões vitícolas do país. Vinhos de edição limitada que, pela menor produção, permaneceram fora dos circuitos das grandes superfícies e que, por isso, foram capazes de manter-se autênticos.

A intenção do SWOP é reconhecer o valor e preservar a identidade única deste património, ao nível da tradição local e familiar, da viticultura sustentável, que respeita o ambiente, e da enologia minimalista, que salvaguarda a origem geográfica e as idiossincrasias dos vinhos.

Os mentores do SWOP pretendem, assim, evidenciar o caráter humano diferenciador na produção de vinhos e contribuir para que estes não percam a sua "personalidade" conforme as modas do mercado e que, no respeito pelas velhas práticas, se assegure mais emprego e melhores rendimentos para as populações locais.

A "Vinhos & Segredos", no Funchal, é a primeira loja SWOP a abrir no país.

 

Paulo Santos
Direção Regional de Agricultura e Desenvolvimento Rural

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