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Agricultura Familiar: que futuro?

agricultura familiar 1Como é por todos sabido, a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) decidiu, dedicar o pretérito ano de 2014 à Agricultura Familiar (AF). Esta decisão ancorou-se no facto deste “tipo” de agricultura ser a responsável pelo abastecimento dos mercados alimentares mundiais em mais de 70% da sua oferta, o que dava uma dimensão de importância à AF não imaginada ou, talvez, sequer prevista.

Em termos de caracterização, considera-se “agricultura familiar” como o modo de organização das atividades produtivas, de gestão do ambiente e de suporte da vida social nos territórios rurais, assente em explorações agrícolas familiares, sendo estas, por sua vez, definidas como as explorações em que a mão de obra familiar, medida em Unidades de Trabalho Ano (UTA), é superior a 50%. Logo são explorações em que a intervenção do agregado familiar no seu funcionamento é preponderante.
agricultura familiar 2 agricultura familiar 3 Perante estas considerações, torna-se óbvio que a agricultura da Região Autónoma da Madeira (RAM) assenta, maioritariamente, na AF, pois mais de 80% das suas explorações estão enquadradas nos seus pressupostos.

Foi esta a razão porque, ainda em 2014, foi decidido debater a sua situação na RAM numa conferência específica, realizada em maio, a qual contou com vários agentes do sector agrícola e de outros intimamente a ele ligados (como o turismo, o ambiente, a gestão do território, etc.), que se saldou num enorme sucesso, não só pelo público interessado, como pelas conclusões retiradas dos vários debates e exposições. Cabe, também, aqui, referir que este tipo de debates se estendeu a muitas outras zonas do País, tendo-se chegado ao final daquele ano com um maior conhecimento da realidade agrícola nacional e com a perceção da necessidade de levar à prática muitas ilações então retiradas.
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É neste âmbito que, já em 2018, foi publicado o Decreto-Lei n.º 64/2018 de 7 de agosto, que consagra o Estatuto da Agricultura Familiar. Este Estatuto visa vários objetivos, como:

• Reconhecer e distinguir a especificidade da AF nas suas várias dimensões: económica, territorial, social e ambiental;

• Promover políticas públicas adequadas a este estrato social;

• Incentivar e valorizar a produção local e aperfeiçoar os circuitos económicos dos produtos agrícolas;

• Promover uma agricultura sustentada, incentivando a melhoria dos métodos de produção;

• Contribuir para contrariar a, sempre indesejada, desertificação;

• Conferir à AF um valor estratégico a ter em conta na definição de prioridades das políticas agrícolas;

• Promover uma maior equidade na concessão de incentivos e condições de produção.

O citado DL também prevê a criação de uma Comissão Nacional da Agricultura Familiar (CNAF) com competência no acompanhamento da aplicação do diploma, na avaliação anual do funcionamento do regime e elaboração do relatório anual, relativo à sua aplicação. Esta Comissão é presidida pelo Exmo. Senhor Ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, contando, na sua constituição com diferentes membros de várias áreas governativas, como Finanças, Justiça; Educação, Trabalho e Solidariedade Social, Saúde, Planeamento e Infraestruturas, Economia, Ambiente e Mar, bem como várias outras entidades, como organizações de produtores, de desenvolvimento local, das Associações Nacionais de Municípios e de Freguesias, entre outras. Como é natural, as Regiões Autónomas foram tidas em conta nesta representatividade, estando, também, presentes, nesta Comissão, dois membros (um dos Açores e outro da Madeira) escolhidos pelos respetivos Governos Regionais.

Esta Comissão já reuniu, pela primeira vez, a 14 de dezembro do ano transato. Nesta sessão foi feito um ponto de situação sobre a implementação do DL n.º 64/2018, bem como se debateu o conteúdo da futura Portaria relativa ao procedimento de reconhecimento do Estatuto da agricultura familiar aos agricultores.

Constatou-se que existem muitas matérias em que a RAM tem competências, podendo o Governo Regional proceder a adaptações do DL à Região, considerando as especificidades do sector agrícola madeirense. Noutras matérias, onde o GR não tem esta competência (regime fiscal e de segurança social, por exemplo), concerteza que a Região apresentará propostas concretas, que tenham em conta as características das explorações agrícolas familiares locais e dos seus agricultores, que possam vir a ser tidas em conta nas medidas de incentivo e defesa deste tipo de agricultura.

O primeiro passo está dado, existe suporte político para que o Estatuto de Agricultura Familiar seja uma realidade; há todo um interesse, transversal a todos os elementos envolvidos na Comissão, em propor medidas positivas que salvaguardem a defesa e promoção destas explorações. Mas, para que tudo isto seja uma realidade, há que contar com a colaboração dos agricultores, com os seus conhecimentos, com os seus anseios.

Façamos votos que, daqui a um ano, voltemos aqui, a este boletim informativo, com mais novidades e/ou anunciando novas medidas de apoio à AF, e que o Estatuto que lhe está adstrito seja um sucesso, para bem do sector agrícola regional.

Ricardo Costa
Direção Regional de Agricultura