Pipocas - do campo para a "boca" do Cinema! (parte VI) |
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Para que quem viaje pelo cinema se perca menos no intrincado dédalo de ruelas e veredas que lhe conferem uma geografia instável, seria então recomendável recorrer ao auxílio de uma bússola de magia bem calibrada que ajudasse como regressar à estrada (supostamente) principal. Ao embrenharmo-nos na fascinante aventura do cinema com as pipocas, ou vice-versa, justificar-se-ia assim dispor dum instrumento com aquela habilidade, mesmo contando com a sua fiabilidade incerta. Não se desse adicionalmente o caso de ser um objeto raríssimo em local e propriedade desconhecidos e nem ainda arqueólogos da fibra de Indiana Jones terem conseguido identificá-los. Contudo, quando se tenha a sensação de ter entrado num beco sem saída, ou estar a palmilhar um caminho interminável, nem mais que o cinema para vir em socorro.
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A título de curiosidade, porque na terra de nascimento a associação perdera atualidade e a ideia resultaria, no mínimo, nada imaginativa, uma empresa alemã, a «Nordmende», quando lançou do lado de cá do oceano o seu micro-ondas, chamou as pipocas para atrizes do respetivo spot publicitário. Alguns anos mais tarde, após a invasão dos domicílios pelo vídeo, o reinado partilhado com o pequeno-écran sem o mínimo derramamento de sangue, formou-se mesmo um trio perfeito. De facto, tornara-se ainda mais tentador recarregar os baldes das pipocas: com o incansável cozinheiro-robot a produzi-las, onde se acomodassem os outros dois equipamentos, estes deixariam um filme onde estivesse, obedientemente parado! Controlados os territórios que a televisão supos dominar, o cinema não deu descanso aos seus engenheiros, a cuja equipa juntou inopinados convidados de vestes compridas e chapéus afunilados, mandando-os prosseguir na pesquisa de fórmulas inéditas para atrair público ao seu primordial local de culto: as salas escuras nas grandes avenidas, nas ruas movimentadas, nos "cogumelos" de diversão, nos bairros populosos e noutros lugares exteriores com gente disposta a partilhar experiências. Paralelamente, numa estratégia a prazo, ia prospetando terreno virgem para que se mantivesse a visionar da forma original, metendo-se nos projetos dos mega-centros-comerciais que se avizinhavam construir. Faltava um ano para o início da década de oitenta, quando competiu (e com que competência!) a Francis Ford Coppola, com o magnificente «Apocalypse Now», dar estreia à tecnologia «Dolby Stereo». Com aquele som envolvente, os espetadores ao centro, nunca foi tão impressionante escutar a «Cavalgada das Valquírias» de Richard Wagner. Às notas daquela composição irrepetível, entremeadas pelo rumor de cascos metálicos pisando os ares, os cavalos ali bestas voadoras evoluindo num bailado que seria sublime não fosse simultaneamente terrífico, porque antecipador de dor e morte. Coppola finalmente contrariara a tese de François Truffaut de que o cinema jamais conceberia, pelo que se deixava extasiar por ela, um filme convincentemente antiguerra.
(continua na próxima edição do DICA)
Paulo Santos |
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