O transporte rodoviário de produtos vegetais – Parte II |
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O mesmo que, vendo-me espantado a olhar para a carrinha de "caixa aberta" onde vinha empoleirado, terá dito para os seus botões «olha aquele parvo, nunca viu um carro de banana». Não sei o seu nome, nem ele mo disse, mas também não será importante para a colação. Mas lá estava o dito, o rosto tisnado pelo sol bom da Ilha, ainda o borrão de cigarro preso entre os lábios, e logo disparou «o senhor vai escrever sobre essa coisa do transporte de verduras do campo para a cidade, mas olhe que para o haver, primeiro veio o caminho e depois o carro...». Parei, para refletir sobre aquele aparente enigma, de súbito do género "o que nasceu primeiro, o ovo ou a galinha", mas o homem não deixou e prosseguiu «...olhe que o Governador Civil José Silvestre Ribeiro, em ofício de 1850, dizia ao Ministério do Reino considerar "sem estradas a Ilha da Madeira"...». Sem pausa que se notasse, continuou «...em junho de 1912 o presidente da Junta Geral, em reunião da Comissão administrativa, admite que é de tal forma lastimável o estado de atraso em que se encontra o distrito em matéria de viação que é necessária a construção de estradas...». Depois de uma ligeira pausa para humedecer os lábios, a pirisca do cigarro sempre na mesma posição, continuou «mas olhe, o primeiro automóvel que circulou no Funchal, foi em 1904, um Wolseley dum tal Harvey Foster, que veio passar uns meses de férias com a família aqui à nossa Ilha.....». Acelerando, com muito mais ímpeto do que naquele carro provavelmente atingiria, percebi dizer «...mas o primeiro registo automóvel realizado na Madeira foi o de um Dion Bouton, em 1907, da Empresa Madeirense de Automóveis, constituída nesse mesmo ano e à qual a Câmara Municipal do Funchal faz a primeira concessão de exploração dos transportes públicos...». Estamos a gostar muito desta história da História dos transportes na nossa terra, deixemo-la por agora, e retomemos o tema a que nos propusemos. Consultando os trabalhos do Eng. Paulo Baptista sobre esta área, os quais reputo de elevada qualidade, nomeadamente "Higiene e Segurança Alimentar no Transporte de Produtos Alimentares" e "Sistemas de Segurança Alimentar na Cadeia de Transporte e Distribuição de Produtos Alimentares", será importante reter o seguinte: "O manuseamento pós-colheita (onde se integram as operações de transporte), dos produtos agrícolas depende da especificidade do produto, do mercado a que se destina e do circuito de distribuição. No entanto, podemos considerar alguns objetivos transversais, a ter em conta em todas as cadeias de manuseamento pós-colheita. Todas as cadeias de manuseamento pós-colheita de produtos hortofrutícolas devem ser concebidas, dimensionadas e operadas de forma a evitar perdas excessivas e garantir a qualidade e segurança dos produtos. Todos os sistemas de manuseamento pós-colheita devem satisfazer os seguintes requisitos: • Evitar danos mecânicos; • Minimizar as perdas de água; • Minimizar a atividade metabólica dos produtos; • Evitar contaminações e minimizar a atividade microbiana; • Garantir a segurança alimentar." Os principais perigos potenciais em termos de segurança alimentar no transporte de produtos alimentares são: "• Desenvolvimento microbiano por exposição do produto a uma temperatura elevada na carga, durante um tempo excessivo; • Desenvolvimento microbiano por inadequado arrefecimento prévio do produto e/ou do veículo/contentor de transporte; • Desenvolvimento microbiano por inadequada manutenção da temperatura durante o transporte; • Desenvolvimento microbiano por exposição do produto a uma temperatura elevada na descarga, durante um tempo excessivo; |
• Contaminação física devido à má manutenção da estrutura do veículo/contentor de transporte; • Presença de água no veículo/contentor de transporte que promova condições mais favoráveis ao desenvolvimento microbiano no produto; • Contaminação por perda de hermeticidade das embalagens, derivada da má manipulação; • Contaminação química resultante da presença de substâncias contaminantes, incluindo odores; • Contaminação (microbiológica e/ou física e/ou química) devido à falta de higiene dos veículos de transporte; • Contaminação (microbiológica e/ou física e/ou química) devida à falta de higiene dos locais de carga e/ou descarga." De molde a minimizar a ocorrência dos perigos enunciados, é também possível enumerar um conjunto de medidas preventivas que podem ser consideradas para minimizar a probabilidade de ocorrência desses perigos: "• Efetuar a carga do produto em condições de temperatura adequadas (e.g. cais de carga refrigerados); • Assegurar a estabilização térmica do produto à sua temperatura de conservação antes da expedição do produto; • Colocar a carga no veículo/contentor de forma a permitir uma adequada circulação do ar; • Verificar a temperatura do produto à carga; • Verificar as temperaturas do veículo/contentor aquando da receção do transporte para carga; • Verificar a temperatura do veículo/contentor durante o transporte; • Calibrar as sondas de temperatura utilizadas na monitorização de temperaturas no transporte; • Assegurar a manutenção do sistema de refrigeração do veículo/contentor; • Verificar a temperatura do produto à receção; • Efetuar a descarga do produto em condições de temperatura adequada (e.g. cais de carga refrigerados); • Após a descarga, colocar o produto armazenado em câmaras à temperatura correspondente à conservação do produto; • Verificar o estado de manutenção do veículo/contentor aquando da receção para carga; • Verificar o adequado estado de higiene do veículo/contentor aquando da receção para carga; • Cumprir as boas práticas de manipulação de forma a assegurar a integridade das embalagens dos produtos alimentares; • Utilizar embalagens adequadas para assegurar uma proteção eficaz do produto durante a realização, em condições normais, das operações de transporte e distribuição; • Evitar sobrecargas, limitando a altura de sobreposição de embalagens no transporte; • Assegurar o cumprimento dos programas de limpeza, desinfeção e manutenção dos veículos/contentores; • Assegurar o cumprimento dos programas de limpeza, desinfeção e manutenção dos locais de carga e descarga de produtos alimentares, e de todas as outras áreas onde ocorre a manipulação de produtos alimentares." Nota: este texto contou com a preciosa ajuda, no que à matéria da história dos transportes na Madeira se refere, de Maria de Fátima Abreu, através do seu trabalho "Memórias: O Funchal com «viação acelerada»".
Paulo Santos |
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